Auditório Nossa Senhora Auxiliadora, Reunião de Recortes, 29 de agosto de 1992 – Sábado
A D V E R T Ê N C I A
Gravação de conferência do Prof. Plinio com sócios e cooperadores da TFP, não tendo sido revista pelo autor.
Se Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:
“Católico apostólico romano, o autor deste texto se submete com filial ardor ao ensinamento tradicional da Santa Igreja. Se, no entanto, por lapso, algo nele ocorra que não esteja conforme àquele ensinamento, desde já e categoricamente o rejeita”.
As palavras “Revolução” e “Contra-Revolução”, são aqui empregadas no sentido que lhes dá Dr. Plinio em seu livro “Revolução e Contra-Revolução“, cuja primeira edição foi publicada no Nº 100 de “Catolicismo“, em abril de 1959.
Leitura das seguintes notícias:
* The Wanderer 30-7-1992 – “Carta do Vaticano conclama os Bispos [norte-americanos] a se oporem às leis dos direitos dos homossexuais.” / O documento intitulado “Algumas Considerações sobre a Resposta Católica às Propostas Legislativas Visando a Não-Discriminação de Homossexuais” reafirma fortemente a carta de l986 da Comissão para a Doutrina da Fé aos bispos americanos, sobre os cuidados pastorais com os homossexuais, e o aplica ao atual movimento visando seus direitos civis.
* Rocky Mountain News (Denver), 30-7-1992 – “Grupo gay responde ao Vaticano”
* San Francisco Chronicle, 25-7-1992 – “Arquidiocese de São Francisco opõe-se à carta do Vaticano sobre leis que discriminam homossexuais.”
O noticiário merecia ser dado anteriormente a qualquer outra notícia hoje, por causa da importância em dois pontos essenciais:
Em primeiro lugar, a gravidade moral dessa atitude de numerosos arcebispos e bispos [nos Estados Unidos em 1992, n.d.c.]. Não é só deles, percebe-se bem, para quem tem a prática das coisas, que no silêncio enorme do episcopado, em que não há notícia de um só que se tenha levantado para hipotecar a João Paulo II a sua solidariedade, nesse silêncio há uma afirmação que contém o seguinte: por enquanto ainda nós não nos revoltamos, mas deixe crescer o “embrulho” que haverá um determinado momento em que nós nos revoltaremos.
Quer dizer, quando nós percebermos que o movimento revoltoso a favor dos homossexuais tomou um número suficiente de aderentes para ter uma verdadeira importância no conjunto da opinião norte-americana, quando sobretudo nós notarmos que a atitude daqueles que não se comprometem do lado dos homossexuais, mas que não se indignam com o favorecimento destes, que a atitude desses constitui uma mancha enorme de gente dentro dos Estados Unidos, e que, portanto, no total os que não querem a repressão à homossexualidade por razões diferentes, uns porque são a favor da homossexualidade, outros porque não são a favor da homossexualidade, mas por preconceitos liberais e outras razões assim não querem que ela seja reprimida – quer dizer, vamos dizer que em tese destes alguns gostariam que a homossexualidade não existisse, mas são contrários a uma repressão à homossexualidade –, uns e outros formem uma massa de gente bastante numerosa, nós colocamos o papa diante de um xeque-mate:
Ou há uma cisão enorme dentro da Igreja Norte-americana, de maneira tal que este bloco pró-homossexualidade ou pró-tolerância criminosa para com a homossexualidade, é bastante grande para que a ruptura dele com Roma enfraqueça muito a Igreja Católica norte-americana, nesse momento nós veremos se a Santa Sé tem coragem para enfrentar a massa enorme que se levanta contra ela.
Essa indagação desse panorama tem ainda um outro aspecto.
Há movimentos de homossexuais organizados mais ou menos pelo mundo inteiro. Então levanta-se a pergunta seguinte: se esses pró-homossexuais ou pró-tolerância para com a homossexualidade se estes se separarem em um número considerável nos Estados Unidos, qual é a repercussão deste fato entre católicos de outros países?
Quer dizer, haverá a possibilidade de que em vários outros países se definam movimentos pró-homossexualidade ou pró-tolerância para com os homossexuais? Nós estaremos diante de uma ruptura como que protestante geral contra a Igreja Católica? Ao que ficará reduzida a Igreja Católica, como força humana, como força natural, como força temporal se houver uma ruptura dessa natureza?
E mais ainda. Dos que são contra a homossexualidade, dos que são contra a tolerância para com os homossexuais, dos que têm, portanto, neste ponto pelo menos uma mentalidade reta, quantos terão coragem de enfrentar a tempestade assim armada contra a Igreja? Ou, pelo contrário, recomendarão silêncio à espera de melhores dias para que a Santa Sé tome uma atitude enérgica?
Estes trabalharão a favor da homossexualidade, porque paralisando por tempo indeterminado a reação contra a homossexualidade, eles abrirão as portas da Igreja para a homossexualidade indefinidamente. E a homossexualidade não mais como uma coisa disfarçada, oculta, velada, mas como uma coisa que de fato é tolerada, senão de uma tolerância doutrinária, pelo menos de uma tolerância efetiva. Quer dizer, na ordem dos fatos existe a tolerância.
Na ordem das doutrinas o que haverá? Talvez a doutrina anti-homossexual continue a manter-se de pé, mas cada vez mais silenciada, cada vez mais calada. De maneira que um belo dia, no ambiente interior da Santa Igreja Católica Apostólica Romana, da única Igreja verdadeira, do único Deus verdadeiro, a atmosfera é como isto se tivesse permitido.
Não sei se eu estou exprimindo bem a gradação e qual é a política que a meu ver segue esta Revolução homossexual. Revolução que só pode ser mencionada com esse título, porque é uma Revolução homossexual. É uma revolução e essa revolução é a favor dos homossexuais. De um modo ou de outro eles é que lucram com essa revolução, logo ela é a favor deles.
Evidentemente isto é para habituar a Igreja a uma apostasia, neste ponto, tão, tão grande, com um silêncio tão completo, que a Igreja fica reduzida ao grau mínimo a que Ela possa ser reduzida para ainda existir, para que não seja desmentida a promessa de Nosso Senhor Jesus Cristo de que as portas do Inferno não prevalecerão contra Ela.
Nessas condições naturalmente chegará o fim, porque nesse momento o demônio pode tentar uma extinção da Igreja Católica. Reduzida a uma força temporal tão pequena, que se Ela por mais um pouco não existe, já se pode precipitar os acontecimentos e extingui-la. Para que esperar que Ela morra, que Ela se evanesça? Se Ela está fraca e tênue como um fio de aranha, [dá-se] uma tapona no fio da aranha e rompe com essa história de uma vez!
Aqui os Srs. têm um outro aspecto que é tremendo, que é o ingresso do livre exame na Igreja Católica. Porque ficará patente que o Vigário de Cristo, o Papa, tem uma posição, e que um número incalculável de católicos tem uma posição oposta – logo que negam a autoridade papal.
É preciso notar uma agravante dentro dessa situação. Essa agravante põe-se assim:
É que não se trata de uma indisciplina apenas contra um documento de João Paulo II. Seria grave, mas não se trata disso. Trata-se de um documento de João Paulo II que é um eco de documentos pontifícios e de ensinamento unânime dos moralistas que é mais antigo do que a própria Igreja. Quer dizer, já no Antigo Testamento a homossexualidade é severamente condenada, severamente proibida.
Não se trata propriamente da homossexualidade o que eu vou dizer agora, mas é uma coisa inteiramente afim. É o pecado solitário que Onan praticou e foi castigado com um raio, não me lembro bem o quê, mas foi castigado imediatamente pela cólera de Deus. A homossexualidade é, a seu modo, ainda muito mais grave do que isto.
Os Srs. percebem, então, que se reúnem as seguintes circunstâncias:
Uma preparação gradual, inteligente, bem feita, para habituar um número crescente de católicos a fazer do problema da homossexualidade um tema de livre exame.
O papa mandou dizer tal coisa, mas o arcebispo de tal, e o arcebispo de tal outro, e o bispo de tal, e o presidente da conferência episcopal do Estado de tal outro, e monsenhor não sei o quê que é um pregador conhecido, sei lá o quê, acham o contrário do papa. E dizem isto de um modo ou inteiramente claro, ou de um modo translúcido de tal maneira que não será preciso de uma glasnost para que isto se veja claramente.
Quer dizer, eles não são punidos por isto, portanto, a Igreja não castiga a quem se revolta contra Ela, mas, pelo contrário, permite que esses homens, que por esta atitude de revolta estão fora da lei da Igreja e que, portanto, normalmente devem estar em estado de pecado mortal, celebrem a Santa Missa, distribuam os sacramentos, exerçam o magistério, que doutrinas dessas se lecionem nos seminários, se lecionem nas associações religiosas católicas, impunemente.
De maneira tal, que nós temos uma Igreja que está reduzida ao silêncio por algo em que entra a moleza, algo em que entra o pânico estratégico de enfrentar um adversário forte e astuto, mas – porque não dizer – entra sobretudo a carência do santo furor contra o pecado, da santa indignação, pela qual um papa santo enfrenta tudo como enfrentou São Gregório VII e como enfrentaram tantos outros papas. Tudo role como tiver que rolar, o rochedo de São Pedro fica de pé!
O ensinamento da Igreja está de pé e enfrenta o mundo inteiro! Se fosse preciso, se houvessem todos os astros do universo inimigos apostados para disparar armas de qualquer espécie contra a Igreja, Ela se levantaria na noite escura e desafiaria as estrelas, mas ela não recuaria nunca. “Veritas Domine, manet in aeternum” – “A verdade do Senhor permanece eternamente”, essa é a verdade!
Acontece que há, portanto, dentro da atitude do Vaticano, com que tristeza o dizemos… eu não quero dizer que haja uma conivência doutrinária com a homossexualidade, mas há uma falta de indignação. Há algo que é o rescaldo, que é o fruto ainda remoto da “heresia branca”, que tem como efeito que diante do perigo não se tem heroísmo, mas se tem toda a espécie de moleza, de conivência, de esperança tonta e absolutamente infundada em que o mal se corrige por si mesmo etc.
O oportunismo político mais deplorável que se possa imaginar, porque propriamente nessa matéria é o oportunismo político mais deplorável que se possa imaginar.
E o adversário, a ofensiva homossexual – que já hoje é um capítulo da Contra-Revolução – que avança certa de que nada lhe acontecerá. Porque nesse clima de impunidade amedrontada, de impunidade inoperante, a nós pode acontecer alguma coisa se tomarmos uma atitude forte contra a homossexualidade, mas aos homossexuais nesse clima não acontecerá nada.
O resultado é que nós estamos diante da disparidade de situações a mais clamorosa, mas nas circunstâncias mais excelentes para a Revolução vencer.
Eu chamo a atenção, então, de que isto tudo se faz não em benefício de um pecado qualquer, vamos dizer, por exemplo, do pecado da mentira, mas se faz em benefício de um pecado abjeto. Uma santa mística do norte da Itália…
(Aparte: Santa Catarina de Siena)
A famosa Santa Catarina de Siena!
Santa Catarina de Siena contou esse fato, que nas suas visões ela se queixava, Santa Catarina, porque Nossa Senhora, Nosso Senhor apareciam e falavam com ela, e se queixavam muito, isso pelo século XV mais ou menos, que o número de homossexuais naquela região do norte da Itália estava crescendo muito. Então ou Nosso Senhor ou Nossa Senhora disse a ela o seguinte:
O demônio, incitador de toda a espécie de pecados, procurava incitar o pecado da homossexualidade, mas que cada vez que um pecado desses se cometia era uma tal violação da natureza, que tinha uma repercussão desfavorável até sobre o demônio. Não porque o demônio censurasse, não que o demônio antipatizasse com isso, não é. Mas seria como um homem, por exemplo, que está num lugar e há ali um terremoto. Embora ele tenha alegria em que o terremoto seja nocivo à propriedade de um vizinho em frente a cuja casa ele se encontra num jardim, embora ele veja que ele não sofre nada com o terremoto porque não atinge as suas propriedades, ele fica alegre vendo que o terremoto prejudica o vizinho.
Assim também é o demônio, ele fica alegre vendo que… da alegria dele São Tomás chama de “gaudium fantasticum”, um gáudio imaginário, que não é real, não é autêntico nem nele. Enfim, ele fica alegre com esse “gaudium fantasticum”, porque ele vê no mundo o número de pecados aumentar, mas esses pecados abalam de tal maneira toda a ordem do ser, que até em Satanás isto produz um efeito penoso. Mais ou menos como no tal homem que vê a casa do vizinho cair no terremoto e que está num jardim onde não vai acontecer nada, entretanto, o tremor da terra faz a ele sentir algo de muito desagradável. Assim também acontece com Satanás em presença da homossexualidade.
Eu não sei se consegui tornar-me claro nesse sentido.
Então temos um pecado tremendo contra a natureza, mas temos também um pecado, a meu ver mais grave do que o próprio pecado contra a natureza, que é o pecado de inúmeros católicos que percebem e querem que sua atitude intimidante obrigue a Santa Sé – tornada débil pela fraqueza humana – a recuar diante do pecado e não cumprir a sua missão. O que a meu ver é uma coisa que participa do sacrilégio. Pode ser que eu esteja enganado, mas é a impressão que eu tenho, que isto participa do sacrilégio. E é uma conivência com o desejo de eliminar a Igreja, de acabar destruindo a Igreja. Isto é outro pecado ainda mais grave.
Terceiro pecado: os Srs. estão vendo que existe a intenção de conduzir a Igreja a um estado em que Ela seja estraçalhada. Não será estraçalhada e o demônio sabe, mas Ela será tão completamente arrebentada quanto é possível. E aqui, esta hora, esse momento, este desejo tem algo que ver com o intuito que fica entre a IV e a V Revolução: é a hora da aparição do demônio.
Eu não sei se nesse último ponto eu também fui claro.
O que é que tem isto de importante? Tem de importante que é tudo, é o fim da História, é o fim do processo revolucionário, é o fim de um pecado de quinhentos anos, e cuja montoeira de pecados de que esse pecado se constitui, brada ao Céu e clama a Deus por vingança. Aí nós não podemos ter dúvida que é também a hora em que a cólera de Deus e de Nossa Senhora intervirão na Terra.
Eu não me lembro bem se mencionei no meio disso a disseminação do espírito do livre exame num país onde a maioria é protestante, e quanta gente católica reverterá para o protestantismo por causa disso. E de outro lado também, o mau exemplo dado pela Igreja Católica aos protestantes, levando muitas seitas protestantes a aderir à mesma posição. Os Srs. estão vendo, portanto, a mancha da homossexualidade como se espalhará por esse país.
Por esse país ou pelo mundo inteiro? Vendo uma nação com o prestígio que tem os Estados Unidos, uma nação que foi o spray do espírito de Hollywood no mundo inteiro, vendo essa nação tornar-se tão conivente com a homossexualidade, é o caso de perguntar se um spray horroroso não espalhará isso sobre toda a Terra. E se isto posto, não é a pergunta seguinte: se o demônio aparecerá, é perguntar se é possível que ele não apareça.
Com isso está concluída essa parte da reunião, com um certo prejuízo para a outra parte. Mas isto é o prejuízo? Não, é lucro, porque isso é de uma importância sem igual.
E eu antes de encerrar pergunto se alguém quer me fazer alguma pergunta.
(Aparte: inaudível)
Respondo com gosto às suas perguntas, ou à sua pergunta.
Há o seguinte: vamos dizer que apareça numa praça pública, na qual nós estejamos, um homem que anuncia que daqui a vinte minutos as estrelas vão se chocar umas com as outras e que haverá uma convulsão. Ele vai encontrar a incredulidade geral, e essa incredulidade resultará do fato de que as pessoas estão firmemente persuadidas de que a ordem do universo é enormemente estável, que ela não sofre perturbações consideráveis de nenhum modo, porque isto está na natureza das coisas. E que, portanto, essas estrelas que vêm efetuando, pelos espaço siderais, todas as suas rotações numa tão prodigiosa ordem que se vê que é desde que elas são criadas. Nada se abala e nada se transtorna, que esta ordem das estrelas têm o seu relacionamento com todo o resto da ordem da natureza. As quatro estações se sucedem muito regularmente em todos os lugares do mundo – exceto São Paulo…
Assim a ordem toda do universo apresenta uma estabilidade enorme! Essa estabilidade nos enche de respeito, nos enche de admiração, mas nos enche também de segurança. E Deus a criou para que nós tivéssemos essa segurança. Deus quis, na sua bondade infinita, que durante a nossa presença na Terra tivéssemos a segurança de que o “cadre”, o ambiente no qual nós estamos funcionaria regularmente.
Esta regularidade encontra uma ressonância dentro de nós mesmos. Tudo quanto há de ordenado dentro de nós, tudo isto exulta vendo o que há de ordenado fora. A nossa saúde exulta vendo a regularidade da Terra.
Vamos dizer, nós temos boa vista e olhamos toda essa regularidade, nos exultamos. Os nossos ouvidos depõem no mesmo sentido, tudo fala no mesmo sentido. Nós sentimos que fomos criados para que em nós exista uma ordem parecida com essa, e que isto é, portanto, uma coisa que tem relação, mas uma relação em profundidade com o nosso próprio ser.
Daí decorre a ideia, e essa ideia já é muito mais fraca, mas uma ideia partida não tanto de uma convicção doutrinária, quanto de uma espécie de experiência interior e exterior de todos os momentos, essa experiência da estabilidade da terra, da estabilidade do universo etc., etc.
Daí decorre uma outra coisa. É que tendo nós – naturalmente eu, como muito mais velho do que os Srs., tendo muito mais conhecido isso do que os senhores, mas os Srs. também – tenho conhecido uma época em que se admitia que a razão humana era capaz de conhecer a ciência, e que a ciência era capaz de dotar o homem de meios pelos quais ele manobraria a natureza, de forma a que a natureza servisse a ele inteiramente e cada vez melhor, e que essa adaptação contínua da natureza às conveniências humanas, impulsionada pela ciência, era para muitos ao que se reduzia a noção de progresso. Uma noção técnica, uma noção de vantagens materiais, de gostos materiais, mas que para eles era muito importante, porque eram materialistas, gente sem fé, para a qual isto é a vida, isto é a existência.
A estabilidade da razão, a estabilidade da ciência, tinha como corolário a ideia de que o grosso dos homens queria isto mesmo, e queria essa ordem e queria o progresso. Queriam essa ordem e queriam o progresso.
Havia assim um consenso geral na Humanidade em favor de fazer tocar todas essas coisas de maneira a segurar a ordem e o progresso no mundo inteiro.
Em consequência disso também havia uma destilação no gênero humano, pela qual os homens mais desejosos de impulsionar o progresso, mais capazes de fazer com que o progresso frutificasse e esses frutos fossem aproveitados nesse impulso de ir para diante, para cima, eles todos constituíam uma elite tácita, que governava tacitamente o mundo. Não só por estar no governo e na direção dos países, mas por estar na direção da sociedade.
Quer dizer, a ciência era dirigida – o movimento científico genérico – pelos cientistas mais eminentes nos vários ramos da ciência; a política pelos políticos mais capazes, assim por diante.
Havia alguma coisa geral, que apesar de desatinos, apesar de roubalheiras, apesar de uma coisa ou de outra, que constituíam para o trem da Humanidade o que a sacudidela dos antigos trens a carvão constituam para o passageiro, quer dizer, aquele tan-tan-tan, tan-tan-tan, quando passava sobre a solda de um trilho com outro, as fagulhas que entravam, a fumaça que entrava, tornavam desagradável um ou outro aspecto da viagem. Mas não havia perigo de uma pessoa qualquer, vendo que o trem sacudia tanto, dizer: “Esse trem vai cair”. Todo o mundo dava risada. Por quê? Porque a ordem da ferrovia se opunha a isto e o trem ia chegar naturalmente a seu fim.
Assim também era o mundo. Tinha lá os seus tan-tan-tans, tan-tan-tans, havia os seus loucos, havia os seus facínoras, às vezes havia um pouco mais de condescendência com a loucura e com a “facinoragem”, e às vezes um pouco mais de repressão, mas no todo, nunca dos nunca dos nunca isto escaparia dos seus trilhos, tudo seguiria dentro da ordem.
É um pouquinho como com o mar. A gente vendo uma notícia, por exemplo, de que o mar invadiu a Praia do Zé Menino em Santos, e que chegou a entrar em alguns prédios de apartamento no andar térreo da praia, ninguém faria esse comentário: “Homem, não sei, esse mar hein! chegou até o andar térreo dos prédios da Praia do Zé Menino, de repente chega até São Paulo…”
Está louco! Por quê? Porque nunca, não vai chegar até São Paulo. Por quê? Por causa da ordem…
Não sei se eu consegui descrever bem o poder e a atração deste sentimento da ordem universal e da estabilidade universal.
Aqueles para quem eu consegui ser claro…
Isso é uma ilusão. Quer dizer, basta romperem com a Igreja Católica, e romperem seriamente e se atirarem no princípio que estão, que a ordem universal vale tanto quanto uma teia de aranha! É uma posição naturalista esta, e que está em contradição com o pressuposto de muitas previsões na “Reunião de Recortes” e de muitas contraprevisões na “Reunião de Recortes”.
Eu faço sentir que se deve contar com tal hipótese assim, assim, assado, e eu vejo em muitas caras permanecendo límpida e tranquilamente átonas, olhando para mim como quem olha para uma cortina dessas…
A réplica é desta ilusão da ordem universal:
– “Não sabe? O Sr. não vê, o Sr. não sente? esta ordem estupenda dentro da qual nós estamos e que habita em nós? E o Sr. pensa que vai acontecer uma coisa dessas?”
Eu diria:
– “Mas de repente uma Pompéia…”
– “Ohohohoh! Pompéia é uma vez. É a única cidade do mundo em que aconteceu isso.
Aquilo que acontece como que uma vez em milênios num só lugar, se tem como não acontecendo. E, portanto, ter medo de um terremoto aqui porque houve há não sei quantos milênios um terremoto em Pompéia, é a mesma coisa do que dizer: Homem, é capaz de hoje à noite entrar um ladrão aqui e pegar fogo em nossa casa, porque neste terreno aqui se ergueu no tempo de Martim Afonso de Sousa um prédio também que pegaram fogo bandidos. Aqui o mesmo fato pode se repetir.
“Está louco, Martim Afonso de Sousa é do tempo da colônia, não tem nada que ver com os dias de hoje! Deu-se naquele tempo e não se vai dar agora. A relação é de um desequilibrado.”
Não sei se o Srs. veem que há duas noções de equilíbrio. Uma noção de equilíbrio que é baseada na experiência individual, pouco raciocinada, mas profundamente sentida, da ordem universal. E outra noção de equilíbrio que é baseada na noção raciocinada, profundamente raciocinada, e em virtude do raciocínio profundamente sentido; uma noção de equilíbrio que é a noção de que esse equilíbrio existe, mas é precário – primeiro.
Segundo lugar: é arrasável.
Em terceiro lugar: por quê? Porque tudo isto existe com base na fidelidade dos homens a Deus Nosso Senhor e à Igreja de Deus, à Mãe de Deus. No dia em que isto se rompa, todo esse equilíbrio é como uma teia de aranha: se arrebenta.
Por quê? Não é só pelos efeitos funestos que o pecado produz sobre a ordem do universo. Isso tem a sua parte. Mas é sobretudo pela punição que Deus dá quando o pecado não é só do indivíduo, mas é das nações.
Quando o pecado é das nações, ensina Santo Agostinho, os indivíduos irão para o Céu ou para o Inferno, mas as nações estarão mortas quando houver o Juízo Final, não haverá mais nações. Elas, portanto, como nações não vão para o Céu ou para o Inferno, e, portanto, as nações pagam nesta vida os pecados que comentem. E o resultado é que quando os pecados sobem a esse auge, é nesta vida necessariamente que Deus pune.
Portanto, o equilíbrio que resulta de Deus enquanto criador e mantenedor da ordem universal, esse equilíbrio tem tanta solidez, quanto tem solidez a pobre criatura humana miserável e pecadora, quanto tem solidez a fidelidade dela a Deus, a Nossa Senhora e à Santa Igreja Católica.
De onde os Srs. vêm na “Reunião de Recortes” a atenção voltada continuamente para este ponto: até que ponto o homem está pecando, até que ponto ele está cumprindo a lei de Deus. É a essência da questão nas “Reuniões de Recortes”.
Por causa disso a ideia que, com rapidez, quando uma nação como um homem, põe o pé na rampa resvaladiça do pecado, aquele é o “water shoot”, que é preciso, portanto, ver com “timore et tremore”, com muito cuidado, porque esse equilíbrio a qualquer hora pode se romper.
Não sei se eu consigo tornar claro aos Srs. também aí a diferença entre a atitude do membro fervoroso do Grupo e do membro que não o é. Para um membro fervoroso do Grupo a noção desta precariedade é contínua, viva e é uma luz que o ilumina, que o faz ver as coisas.
Para um membro não fervoroso do Grupo, a noção é o contrário: é da estabilidade e de uma ausência de Deus, que não pune, que é bonachão etc. Quer dizer, é um Deus HB [“heresia branca”], é um Deus “Monsenhor Emery”, é tudo quanto os Srs. possam querer.
Conclusão: vendo chegar o pecado a auges desses que prenunciam de perto o auge dos auges, não se pode ter outra conclusão senão essa: que nos foi dada a graça – porque um membro fervoroso do Grupo considera isso uma graça – de viver nesses dias de tormento, de sofrimento e de tragédia. Como foi dada a Nossa Senhora e às Santas Mulheres e a São João Evangelista, a graça de assistir expirar o Filho de Deus no alto da cruz, ver a terra inteira que se comove, o sol que se apaga, os mortos que saem da sepultura. Não foi uma infelicidade para eles. É uma desventura, mas não é principalmente uma desventura, e sobretudo não é exclusivamente uma desventura. É a honra incomparável de ter assistido esse momento em que Nosso Senhor e Nossa Senhora trocam o último olhar na vida, Ele entrega o espírito ao Padre Eterno e a redenção do gênero humano se consuma.
É o que eu teria a dizer… [brado]
Nota: Abaixo, entrevista ao Prof. Plinio sobre homossexualismo